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Revista Luz & Cena
Lugar da Verdade - Enrico De Paoli
Neste espaço, Enrico De Paoli fala de suas experiências e histórias em engenharia de música, estúdios e shows.
Fala também do mercado musical e fonográfico e de suas tecnologias.
Postado por Enrico De Paoli em 11/08/2016 às 13:00
Publicado em 11/8/2016 - 00h00

Taí um termo, ou uns termos, muito usados nos últimos muitos anos: "O som do fulano é 'gordão'"; "O som de válvula dá uma 'esquentada' boa"; "O compressor vintage deixa o som 'gigante'". E por aí vai... Se pensarmos que o que deixa o som grande é a adição de harmônicos, e que quase sempre eles surgem decorrentes de alguma compressão na dinâmica do áudio, proposital ou não, começamos a entendê-los e a olhar para eles com outros olhos. E, curiosamente, a ouvi-los com outros ouvidos.

Imaginemos o sinal mais puro do mundo, conhecido também como onda senoidal. Para quem chegou agora, a senoidal é representada não só graficamente, mas também no mundo real, como aquela ondinha pura como uma marola na água, e quando dizemos "pura", significa que, digamos, uma onda senoidal de 1 kHz (ou mil hertz, ou mil ondinhas em um segundo) só vai conter este som, 1 kHz, e nenhum outro. Sim, eu disse pura. 1 kHz é isso e nada mais. Ok... até que você alimente este sinal em um circuito valvulado, ou transistorizado, ou numa fita, ou, nos dias de hoje, na sua placa de som do computador, que contém naturalmente o preamp analógico, logo um cirtuito transistorizado seguido de um conversor AD (analógico para digital).

Ok, se alimentarmos esta onda ainda pura (senoidal) com mais volume do que este circuito aguenta, o "topo" da onda tocará no "teto" do circuito. Com isso, a onda que tinha o topo totalmente arredondado (característica nata da onda senoidal) passa a ter seu topo achatado ou clipado. A palavra "clip" em inglês significa "cortar". Ou seja, uma onda que tinha o topo redondinho, quando passa a ter este topo "clipado", passa a ter quinas. Uma onda que tem quinas é uma onda... quadrada! Sugiro que vocês procurem ouvir e comparar o som de uma onda "sine" com uma onda "square" (senoidal vs. quadrada). Imediatamente vocês notarão que o som da "sine" é puro e doce, e o som da "square" é nervoso e agressivo.

Existe um grande debate sobre quais harmônicos são "bons" e quais são "ruins" para o som. Fato é que, se lembrarmos que engenharia de música é o encontro da física com a arte, temos que, teoricamente, adicionar harmônicos num som puro é errado, mas artisticamente podemos, de fato, honrar o título desse artigo: engordar o som. Cada tipo de clipping, seja entrar com som alto num microfone valvulado, num preamp, numa fita magnética, num Pro Tools ou até num plug-in simulador vintage, vai te gerar harmônicos diferentes. O meu ponto aqui não é dissertar sobre a diferença sônica e origens dos harmônicos ímpares ou pares, ou da combinação deles, mas o fato de que os harmônicos nascem de um sinal comprimido, que, de uma forma boa ou má, altera o formato da onda, gerando outros sons no seu som já existente.

Ok... Estamos o tempo todo imaginando que estes tais harmônicos são adicionados na mix, no compressor vintage ou no plug-in que emula isso tudo. Mas não lembramos o mais básico de tudo: nós não costumamos gravar uma orquestra de ondas puras senoidais! Ou seja, um piano purinho, até muito antes de ser microfonado ou gravado, já contém inúmeros harmônicos em seu timbre. E o mesmo vale para um violão, e um contrabaixo, e por que não as cordas vocais? Microfona-se esses sons e o próprio microfone, dependendo de qual design eletrônico e qual o nível injetado nele, seguindo o sinal para o preamp, muito provavelmente estaremos adicionando algum volume de frequências que são harmônicos do timbre principal (fundamental) sendo gravado. Logo, temos harmônicos diversos misturados e presentes por toda a parte em nosso som. Muito bem...

Agora sim, estamos na mix, e aplicamos alguns tipos de compressores diferentes nos nossos canais, e... obviamente, os compressores comprimem, limitam, diminuem a dinâmica, a variação do volume do nosso sinal de áudio. E, então, nós aumentamos o ganho de saída desse compressor para reestabelecermos o volume do sinal... E, ao aumentar o volume da saida do compressor, adivinhem quem passa a soar mais no nosso som? Eles - os harmômicos. Nessa simples operação (comprimir e aumentar a saída), a gente diminui a diferença de volume entre o som e os harmônicos existentes ali dentro.

Logo, comprimir uma mix é um meio de fazer os harmônicos soarem mais. Mas, por que, quando comprimimos demais, o som fica "empastelado"? Não apenas porque precisamos, sim, de dinâmica no som da nossa música, mas também porque existe um equilíbrio musical e artístico entre um som puro demais e um som com muito mais harmônicos do que o necessário. E qual é o necessário? Essa parte os seus ouvidos têm que resolver junto com a música que eles estão mixando!

Acredite neles! E até mês que vem...


Enrico De Paoli é engenheiro de música e produtor. Conheça um pouco de seus discos premiados visitando o site www.EnricoDePaoli.com. Lá você também pode conhecer seus treinamentos particulares Mix Secrets.
Tags: mixagem
Postado por Enrico De Paoli em 08/09/2012 às 22:49
E o jeito de fazer discos não é uma exceção
Demorou certo tempo até que surgisse o famoso sonho de levar o computador a entrar na engenharia de música (bem, e muitos anos mais para inventarem o tal computador!). Mas quando ele ingressou no estúdio, virou uma festa. Ele chegou com alguma timidez, para não dizer incapacidade. No início, os computadores somente gravavam MIDI. A primeira vez que vi um Mac gravando e reproduzindo áudio foi simplesmente emocionante! E eu pensei: "um dia os estúdios não terão mais mesas.". Demorou até os sistemas de gravação em computador ficarem com capacidade o suficiente para abandonarmos as fitas de gravação, mas este dia chegou, e ficamos com os Macs "voltando" áudio nos canais das mesas.

Não existia processamento suficiente para abrirmos plug-ins em todos os canais, e nem o som dos plug-ins era lá essas coisas. Isso seria um sonho, e este sonho, sim, foi realizado. Temos MacBooks rodando Pro Tools com plug-ins em todos os canais. O áudio soa ótimo e os plug-ins também. Cabe dentro de uma mochila pequena. Isso pra não dizer onde já estamos rapidamente chegando com os iPads. E, agora, qual o sonho de todo mundo? Ter uma mesa analógica clássica, pré-amps valvulados e compressores com botões enormes!

Vamos lá: faz realmente alguma diferença? Que pergunta complicada e que resposta delicada! Vamos começar por algumas vantagens da nossa atual era tecnológica. Para início de conversa, antigamente só gravava disco quem tinha a enorme sorte de ser contratado por uma gravadora, e para ser engenheiro de música, tinha que. nem eu sei! A profissão era desconhecida! Hoje, qualquer pessoa pode comprar um notebook e gravar um disco (às vezes, isso pode não ser tão bom...). Antes, um disco era feito em períodos de horas alugadas de um estúdio. Era caríssimo e depois que você saía entrava um outro cliente, que e mexia em todas as suas regulagens e você nunca mais voltaria naquela mix, caso precisasse. Hoje você grava quando quiser e onde quiser. Mas e o som?

Um Amplitube substitui um amplificador Fender, uma sala maravilhosa e um Neumann M49? Digamos que o som do simulador é inacreditável, mas as milhares de variantes que se consegue com o real são únicas. Agora, se você não tiver o amp Fender, a sala maravilhosa e o M49, com certeza terá um melhor timbre no Amplitube do que no home studio do seu vizinho. E os equalizadores? Um Pultec, por exemplo. As válvulas estão em alta há um bom tempo. Não sei o que acontece com valvulados. Devem ser sexy, pois são realmente desejados. O mais curioso é que os dois pré-amps mais famosos da história, Neve e os API, não são valvulados. O que acontece é que a grande característica do som de um valvulado vem mais do transformador de entrada do que da válvula em si. E a maioria dos equipamentos valvulados (caros) têm bons transformadores em seus designs.

Pois bem, e o que isso tem a ver com os plug-ins? Quem é melhor? Quando o áudio passa por esses transformadores ele é muito modificado. Sim, um famoso Neve, por exemplo, causa uma mudança tão radical no som que ele não seria indicado para uma gravação de cordas que pede uma sonoridade natural e transparente. No entanto, todas as variações, cores, reações que um Neve tem ao receber as mais variadas nuances de música não são tão simples de simular. E tem mais: além da impedância do pré-amp alterar o som lá dentro do microfone, estes transformadores dentro dos prés emitem harmônicos bem diferentes quando alimentados com muito ganho, causando até mesmo uma compressão no áudio. Sim: muitos equipamentos somente em ter o áudio passando por eles com um certo ganho não apenas respondem com mais harmônicos, engordando o som, como também o comprimem, causando aquela sensação de que tudo está mais alto, gordo, no lugar, com os sons todos parecendo mais um único disco. Ou seja, tudo aquilo que a gente busca quando está mixando uma música dentro do computador.

Vale lembrar que cada equipamento causa isso tudo de forma diferente. Se não fosse assim, só existiria um único compressor, um único pré-amp e um único equalizador. E se colocássemos, digamos, 6 dB em 1 kHz em dois Eqs, ambos nos dariam o mesmo resultado. E não é esse o caso. Cada eletrônica reage de forma diferente à quantidade de ganho passando por ela e de acordo com as características do áudio que por ali passa e é processado. Isso tudo torna o plug-in pior? Não. Ele oferece mil vantagens, como preço, tamanho, recall, automação, estabilidade no timbre, quantidade disponível por música etc., mas não tem como emular toda e qualquer situação que um equipamento real geraria.

Se alguém disser ao ouvir uma música no rádio que aquele Eq da voz é plug-in ou real, creio que a afirmação não será feita com tanta certeza, mas pode ser que, no todo, note-se uma mix com um outro resultado. Absolutamente melhor? Não. Absolutamente diferente? Muito possível. Mas não se preocupem: essa insatisfação que faz com que sejamos "do contra" e queiramos os equipamentos todos de volta justamente quando o computador passa a dar conta de tudo não é um privilégio dos engenheiros de música. As canetas eram tinteiro e os relógios eram mecânicos, e eram caríssimos. Inventaram canetas descartáveis e relógios de bateria, mas estes não têm a menor graça!

Bons sons, quentes e cheios de harmônicos (se assim combinarem com a música), nos botões ou nos mouses!

Enrico De Paoli é engenheiro de música. Mixa e masteriza em seu Incrível Mundo Studio e soma classic & analog. Trabalhos recentes incluem Ária, de Djavan, Vodka Smirnoff (campanha mundial) e Jorge Vercilo. Conheça também o treinamento Mix Secrets. Site: www.EnricoDePaoli.com.
Postado por Enrico De Paoli em 01/10/2011 às 12:16
Costumo dizer que os equipamentos não valem o que custam. Bem, não é exatamente assim... Digo, por exemplo, que as diferenças entre um Pro Tools LE e um Pro Tools HD não correspondem à diferença entre os preços deles, ao passo que a diferença entre o preço de um pré-amp de microfone Behringer e de um Neve não equivale à diferença entre o som de cada um.

Sim, os equipamentos melhores são melhores, mas talvez não tão melhores assim. Se há casos em que as diferenças são até imperceptíveis, há ainda aqueles em que o equipamento mais caro pode simplesmente não agradar. Lembre-se sempre de que estamos lidando com música - um mix de ciência exata e inexata. Por isso, em alguns outros casos, um equipamento menos sofisticado pode gerar um timbre com mais personalidade, agradando em cheio ao usuário.

Bom, sendo assim, para que comprar equipamentos mais caros? Vamos por partes. Em primeiro lugar, devemos adquirir o que faz bem aos nossos ouvidos. Ponto final. Porém, aqui vai o ponto chave: assim como um canal "solado" em uma mix não mostra o que ele representa quando tocado junto com os outros instrumentos, em um arsenal de equipamentos a grande diferença está na soma das pequenas diferenças e em como um item interage com os outros. Vou citar um exemplo.

Outro dia, em um estúdio, conheci a nova SSL Matrix. A famosa fábrica das mesas milionárias inteligentemente se adaptou aos novos mercados e agora está fabricando mesas menores, para produtores e engenheiros independentes, home studios e estúdios particulares de alta classe. Então, no estúdio onde eu me encontrava, abrimos uma sessão e ouvi mesma somada no Pro Tools e na mesa. Não acreditei na diferença: praticamente nenhuma! Mas como assim? Não é possível!

Fiz vários testes comparativos, vários A/B, e, novamente, considerando o valor investido (e a beleza que eu via à minha frente), achei minúscula (ou nula) a diferença. Não me contentei e conferi vários outros testes online para tentar entender o ocorrido, o que aconteceu quando recentemente fui aos EUA abrir umas mixagens de um disco que mixei em uma mesa SSL analógica (falarei disso no próximo mês).

A diferença no resultado final do disco foi imensa. Mas peraí? As duas eram SSL analógicas, com teoricamente o mesmo sistema de soma e circuito analógico. Pois é... A diferença nem sempre está em uma "mudancinha", mas na soma delas.

Fazendo uma analogia, quando equalizamos um track ou uma master, se aumentamos 0.2 dB em 3k15 Hz ouvimos pouca ou nenhuma diferença. Bem, claro que ouvimos, mas, convenhamos: não estou falando de 5 decibéis. Já se aumentamos 0.2 dB em 3k15 Hz e diminuímos 0.2 dB em 1k6 Hz, a diferença entre essas regiões vizinhas passa a ser bem maior aos nossos ouvidos. Eles não só estão ouvindo mais 3k15, como também estão ouvindo menos ainda da frequência vizinha (1k6 Hz), que nosso cérebro tinha como referência para julgar o 3k15. Esse é o ponto!

Então, se seguimos com nossa "equalização-mais-do-que-sutil" em algumas frequências, quando finalmente desligamos o equalizador para comparar com o que tínhamos antes, a diferença é um mundo. Bem mais do que 0.2 dB.

Nem sempre 2 + 2 = 4, entenderam? Tá dado o recado!

Boas mixes, boas escolhas e bons resultados para todos.

INSERIR O CURRÍCULO ABAIXO
Enrico De Paoli é engenheiro de música. Mixa e masteriza em seu estúdio híbrido analógico-digital Incrível Mundo. Seus créditos mais conhecidos são Ray Charles e Djavan. Site: www.EnricoDePaoli.com
Postado por Enrico de Paoli em 06/09/2011 às 18:06
Essa talvez seja a pergunta mais comum por trás das cenas da indústria fonográfica. "Quantos dB a mais na voz?", "quantos dB a menos no reverb?" e "tira quantos dB da guitarra?" são algumas frases recorrentes. Mas, afinal, o que é dB? O dB, ou decibel, é uma medida logarítmica e comparativa. Um décimo de um bel é, teoricamente, a menor variação de volume perceptível ao ouvido humano. Teoricamente. Mas essa variação de decibéis não se aplica somente a volumes de um canal de instrumento ou voz. Em equalizações, por exemplo, se uma voz está um pouco escura, precisamos de mais brilho, mais agudo. Então vamos lá: quantos dB de 10 kHz precisamos adicionar no equalizador? Lembremos de que o equalizador não é nada mais do que uma ferramenta que nos permite aumentar ou diminuir os volumes das frequências. Logo, de volta aos decibéis.

Compressão? A mesma coisa. Um compressor diminui a variação de volume de um canal de instrumento, voz ou o programa musical completo. Logo, diminui em "tantos" decibéis o volume de um evento sônico. Sim, mas quantos dB? Como disse antes, dB é uma medida relativa, logo um som é "x" dB mais alto do que outro. Mas não é só isso que é relativo: 1 dB de voz a mais em uma música não é o mesmo que 1 dB de voz a mais em outra, pois por mais que a medida seja igual, a sensação auditiva depende do arranjo, da performance, do microfone, do cantor e da dinâmica daquele track.

O que toca junto com aquela voz naquele momento? Ou, mais importante ainda: o que vinha tocando até aquele momento? Se a mix foi construída no decorrer da música e o arranjo cresceu muito até aquela parte da faixa, 1 dB a mais de voz no refrão pode ser necessário para que o ouvinte ache que ela continua no volume "certo". E mais: embora sensível a mudanças, o ouvido se acostuma facilmente a muitas situações. Quantas músicas possuem vozes super altas, "na cara", ou mixes muito fechadas nos agudos? Elas só soam estranhas para nós se estivermos ouvindo algo muito diferente antes, ou, claro, se o tal timbre não combinar com a música e seu arranjo.

Os decibéis também são relativos nos equalizadores, e 1 dB de agudo é diferente em cada EQ. Se estivermos falando de equalizadores analógicos, mudam os componentes, o design e a topologia do equipamento. Se falamos de plug-ins, mudam os algoritmos e fórmulas. Na prática, mudam a curva de equalização, os harmônicos e - o mais importante - como os ouvidos percebem tudo isso no decorrer da música.

Gosto de usar, como exemplo, um caso de quando eu mixava a turnê Ao Vivo, do Djavan. Na música Pétala havia um lindo solo de sax do Marcelo Martins, que começava num registro mais grave e delicado e ia se construindo até terminar em uma nota longa e altíssima. Em seguida, Djavan voltava, cantando num registro suave. Se eu não mexesse no timbre dele naquele momento, sua voz pareceria "apagada" para os ouvidos que estavam "equalizados" pelo solo de sax que tinham acabado de ouvir. Para que a voz soasse natural e encaixada depois do solo, eu tinha que adicionar de 6 a 8 dB de média-alta e lentamente ir trazendo a voz de volta para a sua equalização "normal". Desse modo, tudo soava natural e encaixado. Sim, dB é algo muito mais relativo do que matemático. Esqueça os números: mixe para a música! E para os ouvidos.

Enrico De Paoli é engenheiro de gravação, mix e master. No momento, está mixando um single do Jorge Vercillo. Conheça o Mix Secrets, sua turnê de palestras e treinamentos. Informações em www.EnricoDePaoli.com.
Postado por Enrico de Paoli em 10/07/2011 às 00:00
Já cansei de escrever sobre compressores por aqui, mas o assunto parece não acabar nunca! De fato, há muito mais em um compressor do que um simples leveling amplifier, ou limitador de dinâmicas. Musicalmente, os efeitos podem ser radicais. Para ambos os lados.

Vamos ao mito: "quando se comprime, o som vem para a cara". Não! Quando se comprime, o som é achatado. Se o timbre de uma performance ou de uma mix é muito frouxo, fazendo parecer que as notas altas são altas demais e deixando as baixas "sumidas", sim, o compressor pode ajudar. Porém, até nestes casos a ajuda tem um preço, que é fazer o timbre engordar. "Mas isso não é ótimo?" Pode ser e pode não ser. Um timbre mais gordo tende a ter menos definição, menos articulação, menos respiração, menos attack, e ocupa mais espaço. Não apenas dentro da mix, mas dentro dele próprio. Mas como avaliar se tudo isso é benéfico ou não?

Além do fato de que mixagem é pura perspectiva, ou seja, o timbre é muito mais do que "como ele soa", mas, principalmente, "como ele soa na mix", um timbre, seja dentro de uma mix ou seja ele o programa todo (uma mix ou uma master), cria dois impactos no ouvinte: como ele soa à primeira vista (ou "ouvida"), e, depois, como irá soar ao longo da música. Pronto - é justamente aí que entra a traição do nosso velho amigo compressor. É muito comum que de início gostemos muito do timbre por ele proporcionado, mas é mais comum ainda que a falta de articulação e de respiração nos cause alguma fadiga e cansaço após ouvir por alguns minutos. Ou até por alguns segundos! Imagine em um disco inteiro. Mas por que isso acontece? E o que fazer quanto a esse problema?

Simples. Alguém disse que temos que comprimir todos os canais de uma mix? Volto a citar um termo que já usei várias outras vezes por aqui: contraste. Tenho adoração por contrastes em qualquer área da vida, e em uma mixagem não poderia ser diferente. O que seria de um timbre articulado se não fosse outro comprimido ao lado? Tá bom, funcionaria, mas o contraste entre os dois pode cair muito bem. Mas não vá comprimir ou deixar de fazê-lo somente pra criar tais contrastes. Tire proveito de um áudio que precise de menos articulação junto a um que soe lindo solto, respirando, como veio ao mundo. E lembre-se de que um track nunca vai soar na mix como soa sozinho, solado.

Além disso, não se concentre em uma única sessão da mix. Por exemplo, não fique mixando o refrão durante meia hora, sem parar. É importante que o ouvido se afine com o que ele vem ouvindo desde o início. Assim, sentirá o refrão como o ouvinte que está escutando a música inteira vai ouvir. Mas agora já estamos partindo para outro assunto... E a ideia dessa página de hoje é simplesmente alertar para não deixarmos os viciantes compressores nos fazerem cansar de ouvir a música.

Boa viagem.


Enrico De Paoli é engenheiro de gravação, mix, master e turnês. Atualmente divide seu tempo entre a tour Ária, de Djavan, e mixes e masters em seu Incrível Mundo Studio. Site: www.EnricoDePaoli.com
Postado por Enrico de Paoli em 10/06/2011 às 00:00
Há algum tempo a moda é falar dos volumes dos discos. Ou melhor, das masters das gravações. Porque a palavra disco saiu de moda. Então, estamos há alguns bons anos discutindo, lendo e debatendo a quantas andam esses discos altíssimos. Mas e o que ouvimos nos shows? Qual o volume certo do som de um show? Quando o PA está alto ou baixo demais?

Bom, não quero estragar meu próprio artigo, mas a resposta é bem simples: se você se pega pensando em "tá muito alto" ou "nossa, que baixo!", provavelmente tem algo errado. Assim como na masterização de um disco, a mixagem de um show deve ser feita para a música. Porém, diferentemente de um disco, o tipo de mixagem de um show ainda depende de outros fatores, como o ambiente acústico, os ruídos de fundo e o tipo de público. Sim: se o show é para uma platéia elegantemente sentada e silenciosa, que está lá para assistir a um "evento musical", o volume provavelmente não precisa ser tão alto quanto o de um show com milhares de jovens em pé, bebendo cerveja e falando alto. Bem alto.

Assim como em um carro a sensação de velocidade pode ser diferente da real, ou um dia de inverno pode causar a sensação térmica diferente da temperatura do termômetro, em um show a sensação do volume pode ser bem diferente do que o decibelímetro lê. De uma maneira geral, a meta é fazer com que o som tenha pressão, mas sem incomodar ou cansar os ouvidos. Mas, de novo, isso vai variar de acordo com o show, local, público e música. Esses elementos todos em uma equação equivalem ao que o público vai esperar do som.

Estou neste momento mixando a turnê Ária, do Djavan. Indubitavelmente, a tour mais difícil da minha carreira. Djavan, por natureza, apesar da origem voz e violão, gosta de espetáculos. Principalmente depois de ter provado dos megashows na turnê Ao Vivo, realizada entre 1999 e 2000. Este show, Ária, é concebido de forma enxuta, com apenas três músicos no palco, sendo baixo acústico, percussão e guitarra, além do artista e seu violão. Ou seja, naturalmente, uma concepção lounge. Porém, o modo de cantar do Djavan revela seu desejo de "showzão". Não apenas isso: os locais onde temos feito shows "pedem" pressão. Para confundir ainda mais, intercalados, no meio da tour, surgem uns shows em locais extremamente diferentes, como teatros com acústica perfeita e público em absoluto silêncio, tentando perceber cada respiração no palco. Então, como mixar essa turnê? Como sempre, o que me salva é fugir das regras. Quando falo "fugir", não quero dizer "não conhecê-las", mas, justamente por conhecê-las, driblá-las.

Existe uma interatividade muito grande entre o palco, a mix e a plateia durante um show. Um "puxa" o outro. Às vezes, mixando um PA mais baixo, você consegue conter o público, fazer com que ele amanse e preste atenção em nuances baixas do show. Porém, se o cantor ou a banda emitirem mais energeticamente, o público entende isso imediatamente e responde com energia em forma de barulho. É aí que o mixer deve ter a sensibilidade de perceber quando ele está no controle do público ou respeitando o que o show pede. Mas, calma - não vá mixar nas alturas e usar essa frase como desculpa! Por mais que o evento peça um som mais energético, lembre-se do início desse artigo... Queremos peso, pressão musical, mas nada que canse nossos ouvidos ou que dure o show todo. Deixe a música pilotar e, definitivamente, não tenha medo dos momentos de baixo volume. Eles podem ser os mais emocionantes, se combinarem com o todo.

Boa viagem.
Postado por Enrico de Paoli em 01/04/2011 às 00:00
Às vezes os assuntos aqui são mais musicais. Em outros momentos, mais sobre o mercado musical do mundo. E também falamos de técnicas de engenharia de música, gravação, mixagem e master, assim como PA e áudio de shows. Normalmente tenho como foco, não apenas aqui, mas também quando estou trabalhando, passar por cima de paradigmas que nos algemam de conseguir resultados bacanas. Apresento, a seguir, um exemplo.

Durante uma mixagem, o engenheiro de som pode passar horas em um canal, achando a "regulagem" perfeita para o compressor. Mas o que acontece quando aquela regulagem perfeita não é tão perfeita assim para todos os momentos da música, como quando, por exemplo, a introdução é totalmente diferente do resto da canção ou quando um cantor canta em um registro e intensidade nos versos e nos refrões ele solta a voz como se fosse a última estrofe de sua vida?

Na era das mesas analógicas e dos compressores externos, resolver este problema não era uma questão tão simples e na cara do engenheiro. Mas se o mesmo realmente conhecesse o equipamento, era possível fazer um paralelo da voz em outro canal da console e alimentar o circuito de trigger/side chain do compressor e pilotá-lo por este fader paralelo em automação. Voilà! Você acaba de fazer automação no threshold do seu compressor valvulado com sua mesa analógica. Mas, hoje em dia, nada disso é mais necessário. Se você conta com um bom sistema de mixagem no seu computador, possui à mão todas as ferramentas para fazer uma mixagem bem rapidinho (não me pergunte por que hoje as mixagens demoram muito mais do que antigamente!).

Mixando dentro do computador, você consegue habilitar a automação para qualquer parâmetro de qualquer plug-in. Nesse caso, habilitemos a automação do threshold do compressor da voz. O motivo é simples: se lembrarmos que o threshold é uma linha imaginária e que o compressor entra em ação somente quando o volume da voz a ultrapassa, fica fácil entender que se você ajusta essa linha para uma introdução cujo volume da voz é sutil, quando chega o refrão, o compressor "achata" a dinâmica da voz por completo, destruindo o timbre da mesma. Por outro lado, se o engenheiro ajusta o threshold se baseando no ganho da voz no refrão, quando tocar a introdução com a voz bem baixinha, o compressor não vai nem perceber o áudio passando por ele.

Logo, aquele paradigma do ajuste perfeito, milimétrico, intocável, do compressor, acaba de cair. Não existe ajuste perfeito. Se a música é dinâmica, muitas vezes os settings dos equipamentos também têm que ser.

Boas mixes. Pois, no fim, é só isso o que interessa.

Enrico De Paoli é engenheiro de gravação, mixes e masters. Atualmente divide seu tempo entre o Incrível Mundo (www.EnricoDePaoli.com) e a tour Ária, de Djavan.
Postado por Enrico de Paoli em 01/03/2011 às 00:00
Depois de anos de reinado, os pré-amps de microfones estão perdendo um pouco de espaço para a sedução dos summing mixers. Chamados também de summing boxes, estes equipamentos têm a função de trazer de volta para o mundo dos workstations digitais o mix bus analógico. O que quer dizer isso tudo? Vamos lá.

"Antigamente", as músicas eram gravadas em fitas e mixadas em mesas analógicas. Não existia conversão de áudio para o domínio digital. As ondas sonoras eram captadas por microfones e transformadas (não convertidas) em voltagem, e assim trafegavam pela eletrônica do estúdio todo. Durante uma mixagem, os canais individuais da fita, que chegavam cada um em um canal da mesa ou console de mixagem, eram, então, todos somados em dois canais para se obter um programa estéreo. Esse estágio em que todos os canais da mesa viravam apenas dois canais era (e ainda é) chamado de mix bus.

O tempo passou e o estúdio passou a caber dentro de um laptop. Se o som melhorou ou piorou, será uma eterna discussão. Fato é que a sonoridade mudou. Durante muito tempo comparou-se som de fita com som de ProTools. Chegou-se a achar que se os timbres fossem captados com a sonoridade clássica e gravados dentro de um computador, o resultado seria igual ao obtido nos estúdios antigos. Não deixa de ser verdade. Mas uma nova teoria chegou ao mercado: se enviarmos os tracks de dentro do computador para um mix bus externo, analógico, chegaremos ainda mais perto do resultado clássico do que se o mixer virtual de dentro do computador fizer o trabalho de somar todos aqueles canais em dois (estéreo). Ok. Mas esse não é exatamente o foco desse artigo. Acredito que sejam milhares os fatores que fazem com que os discos hoje tenham uma sonoridade diferente, e um deles é o método. A logística. O formato (físico) de se trabalhar.

Sentar à frente de um console lotado de faders e botões com tudo à mão faz com que a gente trabalhe diferente. Melhor? Impossível dizer que sim, até porque não há dúvidas de que hoje temos muito mais recursos do que antes. Mas ao mesmo tempo em que isso é ótimo, também é um fator de desconcentração. Quando tudo o que temos são faders, eqs, dois reverbs e dois delays, fazemos uma mixagem, não uma cirurgia sônica. Tá certo que ter 20 compressores diferentes na sua pasta de plug-ins é um belo arsenal de ferramentas. Dá pra modelar um track? Claro! Muito! Mas não é isso que faz uma mix. Faz. Mas não faz.

O que faz uma mix é você reger os tracks de forma que um "fale" com o outro. Quando um instrumento está tocando, ele está no lugar e volume certos para que, na hora em que outro entra, o outro "se sinta especial". Como se os instrumentos estivessem em uma mesa batendo papo e um fizesse o outro se sentir mais bonito. Porém, neste momento, quem está no comando disso tudo é você. E se falamos em comando, falamos em ergonomia. Nossas ações mudam de acordo com a posição das ferramentas e os hábitos físicos que elas nos causam. Exemplo disso é quando um instrumentista se acostuma a tocar uma frase musical por estar viciado naquela digitação no instrumento.

Logo, acho sim que a soma analógica pode fazer alguma diferença, mas os hábitos de quem está mixando certamente causam mudanças radicais no resultado final de uma mix. Qual é melhor? Cada um sabe o que é confortável para si.

Enrico De Paoli é engenheiro de mixes e masters. Viveu toda a transição analógico-digital-virtual e seus créditos vão de Ray Charles a Djavan. Mixa e masteriza em seu estúdio, o Incrível Mundo. Site: www.EnricoDePaoli.com
Tags: mixagem
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