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Revista Luz & Cena
Mixagem
Plug-ins pra levar pra uma ilha deserta
Falando sobre ferramentas de confiança que servem para agilizar - ou até viabilizar - o trabalho
Fábio Henriques
Publicado em 05/01/2015 - 00h00
Sempre que dou cursos e workshops chamo a atenção para o fato de que a gente não pode depender demais de equipamento nem de software. Versões mudam, máquinas dão defeito e se a gente começa a depender muito deste ou daquele item lá se vai nossa capacidade de gerar resultados quando as coisas mudam.

Antigamente, quando só existiam equipamentos, a gente ficava limitado ao que o estúdio podia oferecer. Esse negócio de usar mais de três reverbs em uma música é coisa de tempos recentes. Além disso, a gente era obrigado a trabalhar com o que o estúdio tinha a oferecer. Pra falar a verdade, isso até que era um ótimo exercício pra nossa habilidade, e até hoje minhas mixes em software exibem atitudes moldadas nessas épocas de escassez.

O advento da gravação e mixagem em computador veio diminuir muito e até eliminar essas limitações, pois, de uma maneira ou de outra, as pessoas têm acesso a dezenas de plug-ins diferentes e podem utilizar várias instâncias de um mesmo software, apenas limitados pela capacidade de suas CPUs ou DSPs. As opções são tantas que o usuário menos experiente pode se sentir perdido em meio a tantas opções - o processo oposto ao que acontecia quando éramos obrigados a usar o que estivesse disponível no estúdio.

O que observo, porém, é que a gente acaba elegendo um conjunto de ferramentas em que a gente confia, e somos levados a usá-las sempre em nossas soluções. Como nos projetos o prazo é sempre curto, acabamos elegendo nossos plug-ins de confiança, pois eles garantem um resultado rápido e com a qualidade necessária. Minha proposta aqui então é apresentar os plug-ins que eu levaria pra uma ilha deserta, ou seja, aqueles em que confio e sem os quais o trabalho muitas vezes demora muito para ser realizado ou até mesmo se torna inviável.

Para aqueles que usam plug-ins contrariados, pois preferiam lançar mão dos equipamentos reais, preciso dar um aviso: não me incluo nesta categoria, pois não me preocupo nem um pouco se o plug-in que emula o equipamento X é fiel a ele. Se o plug-in me dá a sonoridade que preciso, não quero nem saber se sua emulação é "fiel", pois o que busco não é o som do equipamento X, mas o som que está na minha cabeça.

Antes de prosseguirmos, preciso alertar o leitor para o fato de que não sou "endorsed" por nenhum fabricante, e me orgulho de minha independência. O fato de eu citar um determinado produto não significa que não haja opções equivalentes no mercado. A coisa é mais pra ser interpretada numa visão funcional do que objetiva.

O CASO DOS EQUALIZADORES

Parodiando o poeta, um equalizador é um equalizador, é um equalizador. E nada mais que isso. O equalizador é o tipo de ferramenta mais usada em gravação e mixagem, e a gente muitas vezes precisa conseguir resultados rápida e confiavelmente. Tenho observado que todo mundo acaba elegendo seu equalizador "de segurança", aquele cujos resultados são totalmente confiáveis. E, convenhamos, se para cada canal que a gente for equalizar tivermos que escolher o melhor equalizador, a mix não vai acabar nunca.


Eu até teria a ousadia de classificar aqui as equalizações em níveis de importância, fugindo um pouco da classificação ortodoxa quanto à função (corretiva x criativa). A afirmação politicamente correta seria dizer que toda equalização em uma mix tem a mesma importância, mas qualquer um que já tenha mixado sabe que existem equalizações mais e menos significativas para uma mixagem. Por exemplo, se queremos apenas cortar os graves no canal do hi-hat, francamente, qualquer equalizador serve. Se, por outro lado, queremos achar o melhor timbre de voz, a coisa muda de figura.

Um outro fator a considerar é a facilidade de operação. A gente sempre acaba usando mais o plug-in com a interface mais amistosa, com a qual nos sentimos mais à vontade. Isso é normalíssimo, e inerente ao ser humano. Não conheço ninguém que diga "esse plug-in é muito difícil de usar, mas gosto muito dele e o uso o tempo todo". Ok, talvez não tenha conhecido gente o suficiente, mas se apelarmos ao bom senso, porque eu escolheria, dentre a enorme quantidade de opções disponíveis, usar uma ferramenta complicada para uma função tão frequente quanto a equalização?

RECRIAÇÃO DE DEFEITOS

Uma coisa sempre me intrigou nessa geração de plug-ins que emula equipamentos de hardware famosos: a emulação é tão verdadeira que recria fielmente até os defeitos do equipamento original. Mas por que? A API faz belos equalizadores e a Waves fez um ótimo trabalho os emulando, como nos casos do 550A e 550B. Os equipamentos originais possuem frequências, ganhos e atenuações em valores pré-determinados, fixos. Não há como dar ganho em 4k, por exemplo. É 3k ou 5k, e essa limitação, na verdade, faz o circuito elétrico ser muito mais preciso e confiável (isso permite usar components de maior precisão, dentre outras coisas). Mas a emulação precisa dessa limitação? Por que não existe uma opção no plug-in que nos permita fugir da "realidade" e colocar a frequência em 4k?


Perguntei isso ao pessoal da Waves (sim, sou chato a esse ponto), e me responderam que em alguns plug-ins isso é possível, mas não nesse. Fica então minha sugestão para a próxima geração de plug-ins, uma em que tenhamos uma realidade expandida, em que eu possa escolher 4k em um API 550x (de eXpandido).

OS ESCOLHIDOS

Voltando ao nosso assunto, então, que plug-in de equalizador eu levaria a uma ilha deserta? Até alguns anos atrás, eu levaria o Focusrite d2: fácil de usar e com um gráfico totalmente coerente com o que se ouvia. A gente chegava a resultados nele com uma rapidez fantástica. Infelizmente, porém, os tempos mudaram e ficamos sem eles.


Hoje, meu equalizador "default", totalmente confiável, é o da própria Avid - o EQ III de sete bandas. Versátil, com auxílio visual, sem limitações induzidas por um hardware original, equaliza decente e eficientemente. Consigo ótimos resultados em pouquíssimo tempo. A interface é muito amistosa e intuitiva. Para quem busca personalidade numa equalização, primeiro eu perguntaria "pra que?", depois alertaria que o EQ III não vai proporcionar personalidade, mas vai fazer exatamente o que a gente quer. Afinal, qual personalidade deve prevalecer, a sua ou a do equipamento?

Quando a equalização é mais exigente e merece muito mais atenção, aí eu recorro ao FabFilter Pro-Q e a seu irmão mais recente, o Pro-Q2. Neles encontro todos os controles necessários para a equalização mais precisa, e há até a opção de se evitar totalmente as rotações de fase. Equalização "cirúrgica", mas com uma transparência invejável.


Neste ponto vale uma observação: sou daqueles que se acham mais importantes que seus equipamentos. Em outras palavras, não quero usar nenhum plug-in que me faça refém. Quem manda no som é o utilizador, não a ferramenta. Tanto o EQ3 quanto o Pro-Q são muito eficientes em serem eficientes ferramentas, e nós continuamos no comando, como deve ser.

Pois bem. Estava eu, do alto de minha autoconfiança, dizendo que um equalizador é um equalizador e que não devia se caracterizar por ter uma "sonoridade" própria, até que usei os Nomad Factory Motown Studio EQs. Eles emulam equalizadores passivos usados obviamente na Motown, e contrariando todas as minhas crenças, soam excepcionalmente únicos.


Tudo bem, mas eu havia afirmado minha vida toda que equalizadores eram apenas equalizadores, que faziam o que se pedia, independentemente de se ter uma sonoridade própria e característica. Pois é. É bem verdade isso, mas estes equalizadores me mostraram o que significa "personalidade". Sua atuação, por falta de adjetivo mais adequado, é "doce". Possuem uma suavidade impressionante e entregam resultados muito interessantes. Lamento apenas que o pessoal que os criou não tenha pensado em uma realidade expandida, onde eu não ficasse preso às limitações do equipamento original emulado. Estes equalizadores realmente são impressionantes, mas são limitados em recursos, infelizmente.

Assim, se eu fosse voluntariamente para uma ilha deserta, precisaria levar o EQ III, da Avid, o FabFilter Pro-Q (ou o Pro-Q2) e os Nomad Factory Motown. Dessa forma, estaria cercado de versatilidade, precisão e personalidade na medida do que fosse necessário.

Em nosso próximo encontro veremos quais compressores nos acompanhariam nestas condições.

Fábio Henriques é engenheiro eletrônico e de gravação e autor dos Guias de Mixagem 1,2 e 3, lançados pela editora Música & Tecnologia. É responsável pelos produtos da gravadora canção Nova, onde atua como engenheiro de gravação e mixagem e produtor musical.
Tags: plug-ins
 
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