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Revista Luz & Cena
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No soundcheck do show
Enrico De Paoli
Publicado em 05/01/2015 - 00h00
(Tá bem: não quero dizer exatamente que o soundcheck será sem a interferência do engenheiro, mas, sim, sem a interferência do engenheiro no andamento do mesmo. Vamos lá!)

Mesmo quem não trabalha com áudio, música e shows em algum momento já ouviu aquele famoso "um, dois, teste, som..." em microfones por aí. E pouco depois disso vêm 15 minutos de bumbo (da bateria), mais 35 minutos de caixa e uns dez para cada tom-tom. E assim segue o famoso e desgastante soundcheck. E quem disse que tem que ser assim? Realmente não sei. Eu não era nascido quando inventaram o processo!

O soundcheck (como quase tudo na vida) não precisa ser cansativo e estressante. Procuro usar o bom senso. Confesso que não invejo muito o engenheiro de monitor, normalmente com cinco músicos pedindo coisas diferentes ao mesmo tempo. E eu não faço questão nenhuma de ser mais uma pessoa a pedir! Então, meu método é deixar o palco seguir e ficar bem pronto pra ir aproveitando o soundcheck "deles" para eu passar "o meu som", claro que após um PA bem alinhado e soando musical.

Não é necessário tanto tempo pra fazer um instrumento soar decentemente. Não estou me referindo à aplicação de efeitos ultracomplexos e nem necessariamente à sonoridade final de cada instrumento, mas se o PA está soando bem, e à medida que o engenheiro de monitor vai passando o palco, nós conseguimos acompanhar passando o PA. E, ao final da "passada" do palco, já estaremos bem próximos de uma timbragem muito decente para cada canal. Então, o que normalmente acontece (se é que já não vinha acontecendo) é que os músicos começam a tocar juntos. Em vez de interrompê-los pedindo coisas, eu, sem sombra de dúvidas, prefiro deixá-los tocando, e eu vou fazendo a minha mix sem "incomodá-los".

Ok, mas nem tudo são flores! Há dois momentos em que eu pego o microfone e converso com a banda no palco: 1) se o soundcheck saiu do controle ou se nunca chegou a começar e eu percebo que não está em andamento, não me custa pegar o microfone com a finalidade de ajudar a conduzir um soundcheck para todos; 2) ou, se após o palco ter passado e eu ter os acompanhado passando o som "pra mim" no PA, eu venha a precisar trabalhar em algum (ou alguns) canais específicos que não tenham sido passados, ou que eu os tenha perdido por algum motivo, ou que eu precise aplicar algum efeito complexo em um determinado canal. Mas, ainda assim, eu procuro trabalhar nos efeitos antes do soundcheck, falando com a minha voz em um microfone enquanto "confecciono" o efeito daquele canal.

Voltando, então, ao momento em que os músicos estão relaxadamente se divertindo, levando um som no palco... Este é um mau momento pra interromper! Quando a banda toca junto é justamente quando o engenheiro tem a sagrada oportunidade de ouvir como ela soa tocando junta. E é neste momento que devemos timbrar os canais, pois estamos ouvindo cada instrumento em perspectiva com o todo, com o arranjo e com os outros instrumentos.

O soundcheck definitivamente não precisa ser do volume do show. Claro que vale a pena ter uma noção do volume em que o show será mixado, mas lembre-se de duas coisas mais: 1) o ambiente sem o público tem muito mais reflexões e faz com que o som fique mais alto; 2) o ambiente sem o público não tem milhares de pessoas gritando durante a música. Eu costumo dizer que a mixagem do show realmente ocorre quando começa o show.

Por fim, se depois disso tudo você não conseguiu ter certeza de que os tom-tons estão soando bem porque durante o soundcheck o baterista os tocou somente uma vez a cada 15 minutos, esta é uma boa hora para pedir os tons e quaisquer outras coisas que precisam de um ajuste final antes que a banda volte pra o hotel!

Bom show!

Enrico De Paoli é engenheiro de música em estúdios e turnês. Mixou recentemente Jorge Vercillo no Riviera Maya Jazz Festival, em Playa del Carmen, México, onde teve um soundcheck dinâmico e incrível que o inspirou a escrever este artigo. Visite www.EnricoDePaoli.com
 
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